quinta-feira, 2 de maio de 2019

Ponto Final

Sua cabeça pesava, seus olhos permaneceram fechados, mas ela já estava acordada há algum tempo. Lutava consigo mesma para voltar a dormir, mas as lembranças a engoliam e todos os pensamentos que a perseguiam estavam ali. Sempre com ele, sempre tudo a ver com ele. Maldita hora que esse cara foi entrar em sua vida, ela estava bem antes. Ela não precisava de ninguém antes e então, vindo diretamente do inferno para sua vida, ele surgiu. E para sua surpresa, passou a depender dele a cada segundo do seu dia. Era quase como um vício, ela sabia que não era saudável. Esperava por sua ligação dia e noite, e independente da hora ela ia quando ele chamasse. Ela queria seu beijo, seu corpo, seu toque. Pensou que fosse algo físico e desapareceria com o tempo.

Como foi trouxa.

Ela passou a querer tudo que vinha no pacote, os passeios de mãos dadas, as brigas, as brincadeiras, a conchinha depois do sexo, os abraços, o consolo que parecia que só ele saberia dar. Ela se apaixonou. Se apaixonou tão intensamente que não percebeu quando isso aconteceu. E merda, ela sabia, sabia tanto que não deveria. Ela sabia, talvez até mais do que ele, que aquela história não daria em canto nenhum. Mas continuou mesmo assim, com todas as condições erradas, ela continuou porque em algum momento ela parou de se importar com ela, era apenas ter ele que importava. Continuou porque ele poderia ter mil defeitos, mas toda a meia dúzia de qualidades que ela via parecia que superava qualquer coisa.

Respirou fundo quando a ansiedade tomou conta de seu corpo mais uma vez, ela não queria abrir os olhos, mas o frio na barriga e o coração disparando falaram mais alto e ela pegou o celular, desejando com toda a força do seu ser que tivesse uma mensagem dele ali, mas é claro que mais uma vez não tinha nada.

Há uma semana não tinha nada.

Ela quis chorar.

Quis gritar.

Quis poder voltar no tempo e corrigir todas as coisas que julgava ter feito errado. Mas sinceramente, ela só precisava corrigir um erro, aquele que deixou ele entrar na sua vida.  

Respirou fundo, tão frustrada o quanto podia. Sabia que precisava levantar e seguir com a sua rotina como qualquer outro dia, fingir que não estava tão afetada e assistir as aulas, evitar o máximo falar dele e fazer seu trabalho no estágio, se esquivar das perguntas e engolir a seco quando nenhuma mensagem que apitasse em seu celular fosse dele. Ela só queria voltar a dormir e acordar em uma realidade onde eles não estivessem separados, onde o último mês e todas as desculpas não tivesse acontecido. Ela não tinha mais tanta vontade de sair de casa, de ver ou conversar com outras pessoas. Nem preciso dizer que ela não ficava com ninguém desde a última vez que esteve com ele. Não importava. Ela só queria se fosse a boca dele a beijar a sua, se fossem seus dedos passeando pelo seu corpo.

Levantou a contragosto, escolheu sua roupa preferida e então o odiou por um instante, praguejando por algum tempo até perceber que não mudaria o fato daquela ser a roupa preferida dele também. O ar faltou e ela se deu conta que aquilo era a saudade mais uma vez. Não parecia normal sentir tanta saudade de alguém como sentia dele. Nem mesmo de sua mãe que morava em outra cidade ela sentia tanta falta. Em algum momento tinha certeza que isso a sufocaria. Então ela morreria. De saudades. Ou de ansiedade, que era seu estado praticamente todo o dia quando não falava com ele. Ainda esperava que em algum momento seu telefone a avisaria que tinha uma mensagem nova, um “bom dia linda”, com o qual ele a havia acostumado muito mal. Era só mais uma manhã normal agora. Onde ela engoliria o choro e torceria pra esquecer ele enquanto outra parte sua torceria pra que ele ligasse.

Ele não ia ligar, nem mandar mensagem, muito menos aparecer em sua porta com flores e chocolate.

Não ia acontecer nenhum desses clichês que ela ficava imaginando em sua cabeça.

Foi intenso e provavelmente durou o que tinha que durar, mas enquanto ela estava no seu caminho para a faculdade não parava de pensar o quanto eles poderiam ter sido incríveis juntos, o quanto o sorriso dele fazia tudo ficar colorido e era só ouvir aquela risada que tudo parecia estar bem. Ela não conseguia esquecer como as mãos deles encaixavam tão bem que pareciam ter sido feitas para estarem juntas. Ela não conseguia esquecer nada sobre eles, as risadas em momentos inapropriados, a preocupação mutua, as brigas.

Ela sabia, lá dentro dela, ela sabia que aquilo havia sido um ponto final. E todas as lembranças eram uma tortura. Mas fazia de tudo e não conseguia, nem ao menos por um minuto, tirar ele da cabeça. Em todas as situações se pegava imaginando e se aquilo fosse junto com ele, e se ele estivesse ali. Era para ter sido só um caso, um sexo sem compromisso, onde ambos se divertiam e no final...

Bem eles não pensaram muito num final.

Ela não pensou que fosse ter um final.

Ela não pensou que no final ela sairia quebrada.

Se ao menos ela não tivesse apostado todas as fichas naquele relacionamento que estava fadado ao fracasso desde a primeira vez em que ficaram. Se ao menos ela não tivesse quebrado todas as suas promessas e se apaixonado pelo primeiro babaca com quem transou. Se ao menos ela fosse menos essa menininha que acredita em contos de fadas.

Talvez ela estivesse inteira.

Talvez eu estivesse inteira.